Como se manifesta a Síndrome de Sjögren
1) Secura da Boca
A secura da boca, denominada “xerostomia”, é um sintoma frequente na população geral, habitualmente causado pela diminuição da quantidade ou qualidade da saliva. Quase todos os doentes com Síndroma de Sjögren têm algum grau de xerostomia. Além do Síndroma de Sjögren, a xerostomia pode ser causada por outras doenças crónicas, como a diabetes, a sarcoidose,a hepatite C e a depressão, bem como por medicamentos (anti-depressivos, anti-alérgicos, diuréticos) ou outros tratamentos médicos (irradiação da cabeça e pescoço, transplante de medula óssea).
Para se compreender as consequências da escassez de saliva, é necessário conhecer as suas propriedades e funções. A saliva é um fluido corporal essencial para a protecção da cavidade oral e do seu funcionamento. A saliva é produzida por 3 pares de glândulas principais ou “major” – parótidas, submaxilares e sublinguais – e centenas de pequenas glândulas “minor”, milimétricas, distribuídas por toda a boca. A saliva é principalmente constituída por água, mas contém mais de 60 substâncias, tendo como principais funções:
Proteger, lubrificar e limpar a mucosa oral
Auxiliar a mastigação, deglutição e a fala
Proteger os dentes da erosão
Proteger a boca, dentes e garganta das infecções por bactérias, fungos ou vírus Suportar e facilitar o sentido do paladar
Se a redução da saliva se mantiver por muito tempo, irão surgir problemas como dificuldade na mastigação e deglutição, rápida degradação dos dentes e infecções da boca (sobretudo por fungos).
Deste modo, é fundamental identificar os primeiros sinais ou sintomas de secura oral. O dentista tem um papel fundamental na detecção precoce da xerostomia, avaliando o volume de saliva acumulado debaixo ou à volta da língua (se for pequeno ou ausente, indica que a pessoa está com défice de saliva) ou a presença de cáries na base dos dentes junto às gengivas ou na superfície de mastigação dos dentes.
Os sintomas de boca seca podem incluir dificuldade em mastigar ou engolir a comida sem a ajuda de líquidos (sobretudo alimentos secos), alterações do paladar, dor ou sensação de ardor na boca e dificuldade em falar.
2) Secura dos Olhos
A secura dos olhos, denominada “xeroftalmia”, é frequente na população, podendo ser causada por redução da produção de lágrima e por perda de lágrima por evaporação excessiva. Ambas levam a desconforto ocular, que pode ser descrito como secura, ardor, sensação de areia ou prurido. Vista cansada, sensibilidade à luz ou visão turva são também características do olho seco.
As lágrimas normais, em pessoas saudáveis, são constituídas por uma mistura complexa de proteínas e outros componentes que são essenciais para a saúde e conforto oculares. As lágrimas são importantes porque fornecem nutrientes e suportam as células da córnea (a estrutura transparente na parte anterior do olho), lubrificam a superfície ocular, e protegem das infecções a superfície exposta do olho. A visão nítida também depende da distribuição regular das lágrimas sobre a superfície do olho.
Nos doentes com Síndroma de Sjögren, a inflamação das glândulas lacrimais reduz a produção de lágrimas e altera a sua constituição, originando secura dos olhos. Em pessoas com olho seco, surgem áreas de reduzida espessura do filme lacrimal, e assim as lágrimas já não protegem nem suportam a saúde das células da superfície ocular.
3) Secura de Outros Órgãos
Além dos olhos e da boca, é frequente surgirem queixas de secura em outros órgãos, sobretudo a pele, vagina ou vias respiratórias (nariz, garganta).
4) Manifestações Constitucionais
Consistem em manifestações gerais, comuns em situações de inflamação ou doença crónica, não sendo específicas do Síndroma de Sjögren.
A febre pode surgir, podendo traduzir actividade do Síndroma de Sjögren, situação em que muitas vezes coexiste anemia, emagrecimento ou quebra do estado geral. No entanto, é pouco frequente, devendo ser sempre investigada a possibilidade de existir uma infecção activa.
A fadiga é frequente, sendo por vezes incapacitante. Em alguns casos pode ser associada à presença de outras manifestações de actividade da doença, mas a maior parte das vezes surge sem explicação aparente, acompanhando-se muitas vezes de dor generalizada ou depressão. Em muitas destas pessoas coexiste um síndroma de Fibromialgia.
5) Manifestações Sistémicas
São manifestações causadas pela extensão do processo inflamatório a estruturas não-glandulares, pela acção de linfócitos (um tipo de glóbulos brancos) e moléculas associadas ao sistema imunitário (anticorpos, citocinas e factores do complemento). Globalmente, são pouco frequentes, estimando-se que surjam em cerca de 25% dos doentes. Não se consegue prever se uma determinada pessoa irá ser afectada por este tipo de manifestações, nem em que altura, embora se saiba que o risco é maior em pessoas que demonstrem sinais de doença mais “activa” – aumento das glândulas salivares, marcadores de inflamação elevados, altos níveis de imunoglobulinas, ocorrência prévia de envolvimento extra-glandular ou anticorpos típicos da doença.
Pode ocorrer inflamação articular, denominada artrite, que se caracteriza pela presença de dor predominante em repouso, com rigidez articular matinal e após períodos de imobilização, e tumefacção (“inchaço”) das articulações. A artrite no Síndroma de Sjögren é habitualmente menos extensa e agressiva do que a Artrite Reumatóide, e não é destrutiva para as articulações, embora possa ser persistente e em casos raros levar a algum grau de deformação articular. No entanto, a maioria dos doentes com Síndroma de Sjögren e dor articular não têm artrite, apenas “artralgias” (que significa dor nas articulações), que podem estar relacionadas com a doença ou com outro problema coexistente, como a Osteoartrose.
A inflamação dos músculos (miosite) é rara, e manifesta-se por diminuição progressiva da força muscular, que deve ser distinguida da fadiga (na qual não há evidência de inflamação muscular).
O envolvimento do aparelho respiratório pode ocorrer sob a forma de tosse seca (por secura da traqueia e grandes brônquios), síndroma obstrutivo semelhante à asma e à bronquite crónica (por inflamação dos pequenos brônquios) ou inflamação do tecido pulmonar alveolar (onde ocorrem as trocas gasosas) e intersticial (onde se localizam as pequenas veias e artérias pulmonares) com dificuldade respiratória e intolerância aos esforços.
O sistema nervoso também pode ser afectado. Os nervos (que constituem o Sistema Nervoso Periférico) afectados perdem a sua capacidade de transmitir as sensações ou ordenar o movimento, originando diminuição ou alteração da sensibilidade (formigueiro, dor em queimadura ou sensação de choques), paralisias locais (pé pendente, paralisia facial) ou alterações do equilíbrio e da coordenação motora. Quanto ao cérebro e à medula (Sistema Nervoso Central), nos raros casos em que são atingidos, surgem enfartes cerebrais, inflamações difusas do cérebro ou de toda a espessura da medula.
O envolvimento renal é pouco frequente, sendo típica a nefrite intersticial (inflamação da zona onde se realiza o equilíbrio da concentração e conteúdo da urina), que resulta em alterações na constituição do sangue. Pode também ocorrer glomerulonefrite (inflamação das estruturas onde o rim “filtra” o sangue), levando a perda de proteínas, edemas das extremidades e aumento da pressão arterial.
Pode ocorrer vasculite (inflamação dos vasos sanguíneos) que habitualmente atinge as arteríolas (pequenas artérias) e capilares, manifestando-se principalmente por lesões da pele, dos nervos periféricos ou do rim.
Em casos raros (entre 1 e 5%) pode desenvolver-se doença linfoproliferativa, após décadas (em média 30 anos) de evolução da doença.
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